segunda-feira, 8 de novembro de 2010

Tão simples, tão livre


Há algo no ato de escrever tão único, tão vivo, pulsante... Por mais que se tente despreender desse ato, desse vício mais ele te chama, mais ele te instiga. Pode-se fugir, se esconder, ceder milhares de desculpas e há de haver aqueles que se mutilem para não escrever.
Uma vez sugeriram a pergunta ao senhor Kappus, não me recordo se está é a grafia correta, se o ato de escrever lhe era realmente algo necessário, algo que não se pode despreender, pois uma vez que se toma o ofício de escritor, como tantos outros ofícios se teria de suportar tarefas maçantes, desgostos e contratempos.
Lembro-me daquela que me sugeriu primeiro buscar em Rilke alguma gema a ser polida, eis que em poucos trechos descobri veios ricos e coloridos, repletos das mais vastas possibilidades de interpretações.
Fui surpreendido por um gesto, um movimento de dedos e um olhar escondido. Um perfume indistinto, raro para meu olfato que tanto memoriza, tenho em meu nariz memória mais leal que em meus olhos.
Não era o perfume em si, logo descobri a mulher, pouco tive de fato, mas muito desejei absorver.
Há muito, desde minha última garrafa escocesa que não tenho tamanho prazer, pequeninos movimentos, palavras despreendidas, alguns toques e de novo o cheiro.
Uma mulher revela muito e tão pouco sabe o quanto podem surpreender um homem, se este se atenta aos detalhes, antes mesmo de verificar a caixa, de tomar a garrafa contra a luz, de ler as informações descobre pelo perfume, pelo cheiro muito mais do que tudo que se pode ver...
Podemos, por exemplo, saber pelo cheiro da caixa se foi armazenado em ambiente úmido, pelo odor caracteristico do papelão molhado, o blend também escapa, antes mesmo de se abrir a garrafa.
Um bom blend, maturado, amadurecido, amargado pelo tempo e pelo sofrimento, devidamente harmonizado e balanceado, quase doce pela adição dos elementos diversos tudo reagindo da forma certa, escolhas importantes e alguns acidentes fazem um bom blend, bem como uma boa mulher.
Não me crucifiquem, não reduzo, aqui, a mulher a um objeto consumível, longe disso! O que me ocorre é a falta de arte, de engenho para descrever a surpresa do acaso, a dose do destino, muito ocorre de formas únicas e tão singelas para compor tanto um bom blend (o que convenhamos todo homem respeita) quanto uma boa mulher (o que nem todo homem respeita).
Há nisso tudo um grande prazer, tudo tão único, onde o tempo e a idade são importantes, mas ao mesmo tempo a composição em si que é essencial, e que o encontro certo dos dois, tanto para blends e pessoas os torna únicos e caros.
Estou a divagar, acho que me surpreendi, experimentei tão pouco e de forma tão suficiente para desejar provar pelo menos por uma vez...

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